Tuesday, February 08, 2005

Gertrude

"La velocità è il segreto. Velocità e tempo. Vedi? Sono tutti verdi..." Virava à esquerda, depois à direita, todos os semáforos pareciam obedecer a um comando à distância escondido ao lado do volante. Sorria enquanto via mais um a mudar de cor, muito antes de lá chegarmos. Não precisava sequer de travar. Sorria como se tivesse resolvido um puzzle, que compunha agora à nossa frente juntando as peças de olhos fechados. Demorámos quinze, talvez vinte minutos. Atravessámos Genova quase de uma ponta à outra, de casa dele até à casa da filha, onde íamos passar a noite. Não apanhámos um único sinal vermelho. À chegada, com a mesma calma com que me tinha ganho um jogo de xadrez poucas horas antes, parou o carro e segredou: "La velocitá è tutto..."

Ultrapasso o taxi, fico atrás de um Audi azul. Vai devagar. Demasiado devagar. Vejo-o a olhar para o espelho, a controlar a distância a que estou. Acelera agora inesperadamente, mal vê o semáforo ficar laranja. Persegue-o um outro taxista, que algumas ruas à frente me vai obrigar a parar para deixar sair um cliente, carregado de malas. Já desisti há algum tempo. Um dia talvez consiga repetir o feito do nosso anfitrião em Genova, há seis anos atrás. Sair de casa, pegar no carro e fazer todo um percurso em Lisboa sem apanhar um único semáforo vermelho. Mas terá sido obra do acaso, certamente, porque aqui não há método que funcione. Confiei durante algum tempo no Gertrude, o sistema informático que controla os semáforos nas avenidas principais. Olhava para o pavimento à procura dos rectângulos metálicos, escolhia as ruas, procurava um método. Soava-me a alemão, o nome, teria de haver forçosamente um método. Uma vez, é verdade, consegui ir de Campolide até à Estefânia sem parar. Mas lá estava um camião do lixo à minha espera quando faltavam ainda quatro semáforos para a Alameda. Nada a fazer. Gertrude é afinal um acrónimo em francês. Genova não tem os condutores de Lisboa. Às vezes um deles é suficiente. Actua sozinho, certamente. Mas as outras... As outras só podem ser o resultado de um trabalho de equipa impiedoso, invisível para a maioria, quase perfeito na forma de actuar. Tenho a firme convicção de ter visto o taxista que ultrapassei hoje a comunicar por rádio o sucedido. Foi quando o outro taxi acelerou, perseguindo o Audi, parando depois poucos metros à frente para deixar sair o cliente. As malas, claro, deviam estar vazias...

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