Thursday, November 09, 2006

A praga

Sair do meu prédio é uma coisa complicada. Entrar é relativamente mais fácil, porque normalmente passo uma primeira vez de carro em frente à entrada e consigo ver se há perigo de emboscada ou não. Mas quando saio... quando saio só posso contar com a sorte. Hoje tive azar. "Olhe, ainda bem que o vejo!" atira logo de rajada enquanto se coloca entre mim e a porta. Não adianta dizer que estou atrasado, que tenho de ir trabalhar, nada funciona. "Preciso de falar consigo sobre um problema lá em minha casa". O problema pode ser qualquer coisa, sendo certo que há perigo de morte se não for resolvido de imediato. Um cheiro estranho, um tapete fora do sítio, uma lâmpada que se fundiu, qualquer coisa. Com as chuvadas recentes pensei logo em infiltrações, inundações, um cataclismo de proporções bíblicas. Enganei-me. Enfim, enganei-me no problema, não nas proporções bíblicas. "Tenho uma praga de insectos lá em casa! Bichos assim pequenos, sem asas, está a ver? É horrível!" Mais uma hecatombe para a lista. Seria letal? "É que eu sou alérgica a esses bichos todos! Ainda morro, eu qualquer dia ainda morro!" Era letal, claro. "Vou chamar a protecção civil, vou chamar a direcção regional de saúde, inspectores da Câmara, tudo! Sabe que a vizinha ao meu lado tem mais de vinte gatos em casa? É daí que vêm os bichos, de certeza!" A ideia de ter a protecção civil e a direcção regional de saúde no prédio agradava-me. Era pelo menos um dia de descanso para mim. Mas ainda assim, estava curioso para saber que insectos seriam. "Não, não são baratas. São pequeninos, assim com asas, mas não voam..." E quantos eram? "Olhe, ainda no outro dia vi um e ia tendo um ataque!" Um? Só tinha visto um? "Nesse dia foi um, mas já tinha visto outro na escadas, apanhei um susto quando ia a sair de casa!" E a vizinha do lado, também tinha visto algum desses bicharocos? "Não sei, ainda não perguntei. Queria falar consigo antes de chamar alguém aqui ao prédio..."

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