Monday, January 30, 2006
Neva em Hudiksvall. Bastante. Talvez 10 graus negativos lá fora, o que até nem é mau para esta altura do ano. "Está frio, não está?" perguntou-me o barbeiro há bocado, enquanto me cortava o cabelo. Respondi que sim, embora não tenha a certeza absoluta de ter sido este o diálogo. Ainda só falo três palavras em sueco e ele não conhece mais nenhuma língua. O comboio de regresso a Estocolmo parte daqui a duas horas. A internet é grátis aqui na Biblioteca, mas só a posso usar durante dez minutos. Tempo apenas para ler o mail e para um pequeno post. Um miúdo louro espera educadamente que eu me vá embora para poder usar o computador. É melhor ir comer qualquer coisa...
Sunday, January 29, 2006
now the snow has covered everything.
"Então pois lembro! Andava toda a gente muito admirada, os que não eram da neve. Eu não, eu já conhecia o que aquilo era. É que eu sou da terra da neve, sabe, eu nasci em Pinhel e estava habituado a andar descalço na neve e tudo. Mas aqui em Lisboa andava toda a gente na rua, muito admir..." O ruído aumenta, perde-se o sinal e a história do senhor que se lembrava de ter nevado em Lisboa há 52 anos atrás. Nunca foi fácil apanhar rádio na zona de Rio Maior. Acelero um bocado para me aproximar do carro da frente, enquanto procuro uma outra estação. O carro derrapa um bocado, depois equilibra-se, continua agora em frente. Acende-se uma luz no painel de instrumentos, é a estrada que está cheia de gelo. Um flash no espelho distrai-me, acabei de ser fotografado. Não é por excesso de velocidade, de certeza. Circulamos a vinte quilómetros por hora, todos. Uma longa fila que se estende pela antiga "estrada nacional", hoje IC2. A auto-estrada do Norte cortada, a do Atlântico também, aquele é o único caminho para Lisboa, não há fuga possível. Outro flash. No carro atrás de mim tiram-se fotografias. À estrada, à neve, às vinhas cobertas de branco, às mesmas árvores que no Verão ardiam e que agora ficam escondidas, até às casas dispersas à beira da estrada, lado a lado com sucatas e lixeiras várias. Tudo ocultado pela neve. Somos todos turistas num país nórdico estranhamente familiar, hoje. Regressa o sinal da TSF. "Vamos agora falar com este outro senhor... como foi, antigamente, lembra-se?" Perfeitamente, irei eu responder um dia. Foi em Janeiro, demorei quase três horas a chegar a Lisboa. Pelo caminho pensei numa casa de praia que sempre me fascinou desde pequeno, construída ali na marginal da Praia do Pedrogão. Um telhado enorme, com telhas muito escuras, parecia um V virado ao contrário, uma chaminé a deixar adivinhar uma lareira gigantesca. Uma casa arrancada dos Alpes e colocada ali, no meio das outras, para ser troçada e olhada de lado desde que me lembro de lá ir. "Para que serve aquilo ali? Até parece que neva na praia!". Nevou hoje. Devia lá ter ido, era a única fotografia que queria realmente ter tirado. Quase que aposto que a lareira esteve orgulhosamente acesa, o telhado inclinado coberto de neve, finalmente a cumprir o seu fim. A persistência é sempre recompensada, um dia...
Saturday, January 21, 2006
And now - an unsuccessful insurance company call
"- Estou?
- Boa tarde. Sr. José Rino? Daqui fala (...) da sua Companhia de Seguros. Gostava de saber se era possível encontrar-me consigo para esclarecer alguns pormenores do acidente em que esteve envolvido...
- Hoje vai ser complicado, é melhor combinar para a semana...
- São só cinco minutos, posso encontrar-me consigo em qualquer lugar, não há problema.
- Não, isso iria ser complicado. Mas posso combinar consigo na segunda-feira, se quiser.
- Não há problema, não há problema! Diga-me onde está, eu vou ter consigo a qualquer lado!
- Bom, está bem. Agora estou em South Kensington, mas daqui a meia hora devo andar por Picadilly Circus...
- (...)
- Segunda-feira?
- Sim, é melhor segunda-feira..."
- Boa tarde. Sr. José Rino? Daqui fala (...) da sua Companhia de Seguros. Gostava de saber se era possível encontrar-me consigo para esclarecer alguns pormenores do acidente em que esteve envolvido...
- Hoje vai ser complicado, é melhor combinar para a semana...
- São só cinco minutos, posso encontrar-me consigo em qualquer lugar, não há problema.
- Não, isso iria ser complicado. Mas posso combinar consigo na segunda-feira, se quiser.
- Não há problema, não há problema! Diga-me onde está, eu vou ter consigo a qualquer lado!
- Bom, está bem. Agora estou em South Kensington, mas daqui a meia hora devo andar por Picadilly Circus...
- (...)
- Segunda-feira?
- Sim, é melhor segunda-feira..."
Friday, January 20, 2006
And now for something completely different...
"A rescue operation was under way this evening to save a wounded whale in the Thames. The 18ft creature sparked excitement after it was sighted swimming past the Houses of Parliament, send spouts of water 20ft into the air. Hundreds of people lined the river on each side to catch a glimpse. (...) It is the first time this type of whale has been seen in the Thames since records began in 1913. Bagy Tokhtokh, 35, who runs a stall selling souvenirs, said: "It's the first time I've ever seen a whale. I'm from Mongolia and they're not very common there."
[the Evening Standard, Friday night edition - 40p outside Blackfriars underground station]
Sunday, January 15, 2006
Monday, January 09, 2006
Histórias de condutor
"George: I got about fifty-feet out and then suddenly the great beast appeared before me. I tell ya he was ten stories high if he was a foot. As if sensing my presence he gave out a big bellow. I said, "Easy big fella!" And then as I watched him struggling I realized something was obstructing his breathing. From where I was standing I could see directly into the eye of the great fish!
Jerry: Mammal.
George: Whatever."
[Seinfeld, season 5 - The Marine Biologist]
"O outro carro capotou? Bem, quando eu tive o acidente, nem imaginas...", contam-me, três semanas depois de ter sido abalroado por um Renault Mégane preto que capotou após o embate, deu três voltas no ar antes de projectar o semáforo que estava vermelho para o Eixo Norte-Sul, e foi ainda aterrar no capot doutro carro que atravessava o cruzamento à minha frente. As histórias que condutores acidentados me têm contado não ficam atrás das histórias de pescadores, parece-me. Com o passar do tempo ganham dramatismo, efeitos especiais. É preciso explicar bem o susto que se sentiu, não foi uma batidela qualquer... Foi exactamente como nos filmes. "O gasóleo na estrada não incendeia, não se preocupe", garantiu-me um dos primeiros bombeiros a chegar ao local, quando lhe apontei o tanque de combustível destruído. Tal falta de visão não lhe irá retirar, no entanto, o papel que lhe reservo na minha história. Foi ele quem saltou do carro dos bombeiros ainda em andamento, já de extintor na mão, e apagou as chamas que avançavam impiedosamente em direcção ao meu veículo. Tinham sido ateadas por um cigarro aceso, atirado para a estrada minutos antes. Grande plano do cigarro aceso, com o semáforo que há-de ficar vermelho ainda a piscar laranja, no início da cena. Tudo isto é pós-produção, claro. Na minha memória ainda só existem as cenas registadas no local... Mas já há algumas recordações com fundo azul, à espera das animações feitas por computador. "E o outro carro? Capotou depois de bater em ti, ou depois de bater no passeio?" Não faço ideia. Fiquei de costas para o resto do acidente, os faróis apontados para o lado contrário. Ouvia as colisões, mas não via nada. Capotou e deu três voltas no ar, por isso. Foi aterrar em cheio no capot do outro carro. É verdade que ele ficou batido foi do lado direito, mas isso era porque vinha já em duas rodas, as duas da esquerda, a tentar desviar-se do Mégane preto. Os relatos de acidentes automóveis nunca são verdadeiros, apenas se baseiam em histórias verdadeiras...
Jerry: Mammal.
George: Whatever."
[Seinfeld, season 5 - The Marine Biologist]
"O outro carro capotou? Bem, quando eu tive o acidente, nem imaginas...", contam-me, três semanas depois de ter sido abalroado por um Renault Mégane preto que capotou após o embate, deu três voltas no ar antes de projectar o semáforo que estava vermelho para o Eixo Norte-Sul, e foi ainda aterrar no capot doutro carro que atravessava o cruzamento à minha frente. As histórias que condutores acidentados me têm contado não ficam atrás das histórias de pescadores, parece-me. Com o passar do tempo ganham dramatismo, efeitos especiais. É preciso explicar bem o susto que se sentiu, não foi uma batidela qualquer... Foi exactamente como nos filmes. "O gasóleo na estrada não incendeia, não se preocupe", garantiu-me um dos primeiros bombeiros a chegar ao local, quando lhe apontei o tanque de combustível destruído. Tal falta de visão não lhe irá retirar, no entanto, o papel que lhe reservo na minha história. Foi ele quem saltou do carro dos bombeiros ainda em andamento, já de extintor na mão, e apagou as chamas que avançavam impiedosamente em direcção ao meu veículo. Tinham sido ateadas por um cigarro aceso, atirado para a estrada minutos antes. Grande plano do cigarro aceso, com o semáforo que há-de ficar vermelho ainda a piscar laranja, no início da cena. Tudo isto é pós-produção, claro. Na minha memória ainda só existem as cenas registadas no local... Mas já há algumas recordações com fundo azul, à espera das animações feitas por computador. "E o outro carro? Capotou depois de bater em ti, ou depois de bater no passeio?" Não faço ideia. Fiquei de costas para o resto do acidente, os faróis apontados para o lado contrário. Ouvia as colisões, mas não via nada. Capotou e deu três voltas no ar, por isso. Foi aterrar em cheio no capot do outro carro. É verdade que ele ficou batido foi do lado direito, mas isso era porque vinha já em duas rodas, as duas da esquerda, a tentar desviar-se do Mégane preto. Os relatos de acidentes automóveis nunca são verdadeiros, apenas se baseiam em histórias verdadeiras...
Thursday, January 05, 2006
O outro
"Imaginaram que todo o homem é dois homens e que o verdadeiro é o outro. Também imaginaram que os nossos actos projectam o reflexo invertido, de maneira que, se estamos acordados, o outro dorme..." - Jorge Luis Borges, "Os Teólogos" (1949)
Do outro lado do planeta, o RINOBLOG é escrito em japonês, desconfio que por uma rapariga. Viverá em Kobe, ou talvez Osaka, perto do Monte Rokko onde tirou esta fotografia. Aprendeu a ler as 22 cartas do Tarot há mais de um ano, para 2006 o destino reservou-lhe a "roda da fortuna". É tempo de mudança, acredita. E de sonhos. O primeiro do ano interpretou-o assim, com a ajuda de um livro: "those which are necessary for by your remaining, it means to start walking in new thing". A tradução do Babelfish não é grande ajuda... São nove horas de diferença, deve estar agora mesmo a preparar-se para ir almoçar ao café com um amigo. Eu vou dormir. "Living to today, it was very pleasant." Aqui também, RINO. Aqui também...
Do outro lado do planeta, o RINOBLOG é escrito em japonês, desconfio que por uma rapariga. Viverá em Kobe, ou talvez Osaka, perto do Monte Rokko onde tirou esta fotografia. Aprendeu a ler as 22 cartas do Tarot há mais de um ano, para 2006 o destino reservou-lhe a "roda da fortuna". É tempo de mudança, acredita. E de sonhos. O primeiro do ano interpretou-o assim, com a ajuda de um livro: "those which are necessary for by your remaining, it means to start walking in new thing". A tradução do Babelfish não é grande ajuda... São nove horas de diferença, deve estar agora mesmo a preparar-se para ir almoçar ao café com um amigo. Eu vou dormir. "Living to today, it was very pleasant." Aqui também, RINO. Aqui também...
Monday, January 02, 2006
You'll have to stand perfectly still
"- Onde é que há rede, aqui?
- Tu tens vodafone... É aqui em cima onde deixámos os carros, sobe aí para esse muro. Mais para a esquerda... isso. Não te mexas! Agora tens de esperar que ele encontre o sinal.
- (...)
- Então?
- Ninguém atende. Tenho de ligar para o tmn... Posso usar o teu?
- Aqui não dá. Temos de descer. A tmn apanha-se lá em baixo ao lado da casa, onde está aquela árvore, vês?
- Ali ao pé daquela horta?
- Sim. Cuidado, olha aí um sapo. Não o pises.
[Gondramaz, no último dia do ano]
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